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SUPER ALIMENTOS NOS TELHADOS DE LISBOA
Super alimentos nos telhados de Lisboa
2014-09-18
Super alimentos nos telhados de Lisboa

Situada no centro de Lisboa, tendo como pano de fundo o Parque Eduardo VII, a primeira horta num telhado, sustentável e certificada, promete trazer aos consumidores produtos biológicos fresquíssimos e prontos a consumir (mas ainda em fase de germinação, com raízese tudo). Justifica-se, assim, o conceito de biovivos que lhes está associado: com uma grande densidade de nutrientes numa pequena quantidade de biomassa, o que os classifica como superalimentos. 

João Henriques é o mentor deste projecto. Designer industrial, professor da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, construtor e inventor de jardins verticais, hortas domésticas e estufas urbanas, deu início à produção com rebentos de ervilha, rebentos de girassol e erva de trigo, produtos que lhe asseguram “uma maior produção de biomassa por tempo e por quantidade de nutrientes.
No menor tempo possível, consigo criar a maior quantidade de nutrientes possível”, funcionando as estufas como “microfábricas locais de vitaminas, aminoácidos, antioxidantes”, sendo essencial vender o produto vivo. “Nós costumamos dizer ‘quer fresco? Compre vivo’. Ninguém come um quilograma de alface à refeição, mas se comermos 100 g de [folhas de] ervilha comemos os mesmos nutrientes do que um quilo de alface”, explica, adiantando que “todos nós temos de comer os verdes e nenhum
de nós come os verdes suficientes. Com estes superalimentos não é preciso comer grandes quantidades para obter a dose diária recomendada na sua totalidade das vitaminas”. Quer isto dizer, que 100 g de folhas de ervilhas, que fornecem umas irrisórias 19 calorias, possuem 3,1% de proteína com enzimas “vivas”, duas vezes mais vitamina C que as laranjas, quatro vezes mais vitamina A que o tomate, quatro vezes mais ferro que os espinafres e oito vezes mais ácido fólico que o feijão.

Quanto aos biovivos de girassol, têm mais antioxidantes que os frutos vermelhos (que demoram quatro a seis meses a crescer em sítios específicos, estufas caras, em explorações que dão muito trabalho). “Eu faço um produto muito mais rico em antioxidantes em 15 dias, ao lado do ponto de consumo. O nível de sustentabilidade de aquisição do nutriente é muito mais elevado, muito mais eficiente e mais bem preparado para o futuro adequado para maximizar a produção local. Depois é muito rico em vitamina D e triptofano. Estamos a falar de uma ‘salada fixe’, como eu lhe chamo”, refere, uma vez que o triptofano é um aminoácido que é metabolizado em serotonina, neurotransmissor responsável pela sensação de felicidade e bem-estar. A erva de trigo é o outro superalimento que encontra na Biovivos.

Considerada o melhor ingrediente para sumos detox (cuja palavra chave é clorofila), a erva de trigo ajuda a purificar e a aumentar o número de células brancas no sangue, ajuda na digestão e desintoxicação do fígado, limpa químicos inorgânicos do corpo, previne as cáries e melhora a função capilar. Uma das melhores fontes que existem de clorofila, é ainda rica em ferro, enzimas, aminoácidos e vitaminas A, B e C.

Uma ideia que deu frutos
A surgirem um pouco por todo o planeta, nomeadamente em Detroit, Nova Iorque – talvez a maior influência –, ou Hong Kong, as quintas nos telhados dos edifícios ou estufas urbanas, além do apontamento de verde que trazem, são actualmente uma forma segura, acessível e sustentável de produção de alimentos, que estão a reestruturar a relação dos seus residentes com a Natureza. São
também a inspiração de João Henriques. 

“O ser num telhado é um factor de segurança naquilo que é instalado. Depois há o factor exposição solar, que no Verão acaba por ser problemático, mas que no Inverno é positivo. É uma questão de conseguirmos controlar o clima o mais possível”, explica. O clima e a poluição inerente aos meios urbanos. Na primeira horta de telhado já se encontra instalado um filtro e dois mais seguir-se-ão, “uma vez que o objectivo é serem estufas antipoluição. Quero produzir de uma forma em que todo o ar que as plantas absorvem passe por filtros, de modo a termos plantas a crescer com ar puro. Sempre fui um
pouco crítico relativamente às hortas nas cidades por isso mesmo. O nosso ambiente está cheio de metais pesados e várias outras toxinas”. Dado tratar-se de um espaço não utilizado, este projecto permite mostrar às pessoas que “é possível utilizar todos os espaços existentes numa cidade para produzir”, frisa João Marques, neste momento também a desenvolver “outros sistemas. Não são jardins verticais, apesar de já ter feito vários – são modelos como linhas de 50 metros num prédio bastante alto, com uma forma fácil de colheita”. Como a estufa instalada no Club VII se encontra equipada com painéis solares, fora da rede eléctrica, estamos a falar de zero combustíveis fósseis, inclusive na distribuição dos produtos – as entregas são actualmente feitas a pé ou de bicicleta –, João Henriques afirma estar perante o produto mais sustentável do mercado. “O impacto ambiental associado ao seu ciclo é negativo – ou positivo, numa perspectiva de absorção de CO2 –, absorve-se mais CO2 do que aquele que se emite e isso é extremamente interessante”,  explica, apontando, no entanto, que “o outro lado extremamente importante da sustentabilidade, muito mais, às vezes, que a ecologia ou a reciclabilidade dos produtos, é a sustentabilidade económica. Para que os biovivos consigam sobreviver ao longo dos anos, não só o produto mas o modelo de projecto, é preciso haver sustentabilidade económica, até porque o objectivo é por cada miniestufa criar um emprego o mais local possível”. Entre os planos para o futuro está, por isso, a ideia de fazer evoluir o negócio em modelo franchising ou “ter um modelo em que uma pessoa quer uma estufa e pede um microcrédito e nós asseguramos logo a venda de 50% da produção localmente, se conseguirmos”.

 

COMO TUDO COMEÇOU
Formação em design com agricultura no currículo.
Designer industrial de formação – tirou Design nas Caldas da Rainha –, João Henriques fez, no 3.º ano do curso, um trabalho que relacionava design e agricultura. Ficaria de tal forma interessado no tema que nos dois anos que se seguiram todos os projectos realizados no âmbito escolar abordaram este
tema. No final do 5.º ano pediu à escola para fazer hortas no telhado – “a escola tinha uns telhados fantásticos, que estavam mesmo a pedir que lá se pusesse umas quantas hortas ou estufas”, tendo-lhe sido cedido um jardim no espaço da escola, onde acabou por instalar a estufa pretendida. A ideia de ocupar um telhado para a produção hortícola remonta a 2003, na altura mais até por curiosidade do que por entender os benefícios que traria para a cidade. Cinco anos mais tarde, em 2008, criaria a Urban Grow, para tentar dar o nome aos projectos e relacionar o design e a agricultura que andava a fazer e que, no início deste ano, deram origem aos Biovivos, que acabaram por se tornar o projecto mais adequado para ocupar um telhado.

 

Texto Helena Estevens

Fotos Filipe Pombo

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