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FILOSOFIA TERAPÊUTICA
Filosofia terapêutica
2013-08-20
Filosofia terapêutica

Como é que Epicuro, Séneca ou Sócrates podem ajudar-nos a viver melhor?
Alain de Botton resgatou os seus melhores conselhos e pensamentos mais práticos e aplica-os à vida quotidiana.
Um sucesso à escala mundial. 

Não é fácil reunir consensos, mas são poucas as vozes críticas que se fazem ouvir quando se fala de Alain de Botton. Filósofo, escritor, ensaísta nascido em Zurique, cativa as massas através do discurso claro, acessível e provocador. A premissa de que partiu parece óbvia, mas foi dele o mérito de globalizá-la. Se na Grécia e Roma antigas os filósofos eram autoridades para as questões mais importantes da vida, porque não estudá-los e aproveitar a sua sabedoria para nos ajudar a viver melhor?

Alain de Botton faz questão de demarcar-se dos tradicionais manuais de auto-ajuda: “A maioria desses livros é escrita por norte-americanos sentimentais e moralistas, que prometem aos leitores a vida eterna e riquezas incontáveis”, afirmou este ano, em entrevista à revista brasileira Época. E, acrescenta, diferenciando a sua abordagem: “A maior parte de nós admite secretamente que atravessar a vida não é uma tarefa fácil e que poderia ser útil aprender a fazê-lo. Há mais de dois mil anos que os grandes filósofos se dedicaram a esses temas. Séneca, por exemplo, dava conselhos aos romanos sobre como lidar com a raiva. As Meditações, do filósofo romano Marco Aurélio, estão entre os melhores textos de auto-ajuda já escritos. Ao dar-se valor a obras como essas, as pessoas cometerão menos erros”.

 

Ascensão meteórica

Curiosamente, a família de Botton é originária da Península Ibérica, mas foi na Suíça que Alain nasceu. Mudou-se para Londres aos 12 anos, dominando o francês e o alemão, além do inglês. Fascinado desde sempre com a forma como as ideias influenciam o modo de viver das pessoas, licenciou-se em História, canalizando o espírito criativo para a escrita apenas no último ano da faculdade. Logo aos 23 anos publicou a primeira obra: Ensaios de Amor. “Inspirei-me nas minhas grandes dúvidas sobre as relações. Aliás, quando escrevo estou apenas a tentar dar sentido ao mundo para reduzir os meus níveis de ansiedade”, confessou o autor numa entrevista dada à revista literária francesa online 3:AM Magazine. O seu primeiro livro analisa o processo de enamoramento e desilusão, num estilo incomum, que mistura elementos de romance com análise própria de obras de não ficção. Em 1997 surgiu o reconhecimento mundial com a publicação de Como Proust pode mudar a sua vida. Este sucesso de vendas transformou-o numa celebridade, recebendo elogios de prestigiadas publicações como The New York Times e The New Yorker. Em contrapartida, o pai nunca chegou a apoiar a sua carreira literária. Milionário, quando morreu deixou a Alain e à sua irmã um fundo no valor estimado de mais de 300 milhões dólares. Devido às relações conflituosas que mantinham, o autor ainda não utilizou esse dinheiro. Até ao momento, publicou mais sete obras, em áreas tão distintas como filosofia, viagens, arquitectura, status, trabalho e religião, misturando pensamentos próprios com análise de autores consagrados. Ateu convicto, continua a viver em Londres, é casado há dez anos e tem dois filhos rapazes.

 

Dos livros para a escola

Paralelamente à escrita, Alain de Botton foi acalentando o sonho de abrir uma escola. Não algo tradicional, onde se debita conhecimento abstracto, mas sim um local onde se passam ideias práticas que nos podem trazer felicidade. Em 2008, concretizou esse ideal e inaugurou The School of Life, em Londres. Pelos seus eventos já passaram mais de 80 mil pessoas. “Tentei criar uma instituição cujo trabalho, até há uns tempos, só era feito pelas igrejas: ensinar a viver mais sabiamente. É frequentada por todo o tipo de pessoas e a maioria sai a sentir-se mais feliz. O que mais apreciam é o companheirismo, o facto de encontrarem pessoas com os mesmos problemas”, disse em entrevista à RECICLA, aquando da sua última visita a Lisboa. As iniciativas que desenvolve pretendem estimular, provocar, alegrar e consolar as mentes. As aulas têm nomes sugestivos: “Como equilibrar o trabalho com a vida?”, “Como fazer com que o amor continue?”, “Como ter melhores conversas?”, “Como encontrar um trabalho de que goste?”, “Como ser cool?”. Mas também se organizam refeições partilhadas, sermões dominicais e fins-de-semana inspiradores. Ao modo de Botton, os professores são autores, artistas, actores e académicos que combinam, numa mistura sedutora, experiências apaixonantes com ideias inspiradoras de grandes pensadores do passado. Zoë Langdell, membro da direcção da escola, revela o seu maior motivo de orgulho: “Nestes cinco anos tirámos a filosofia da universidade e trouxemo-la para o centro da vida das pessoas”. No passado mês de Abril, The School of Life chegou ao Brasil. Em São Paulo, uma primeira turma de 25 alunos passou cinco dias a discutir temas ligados a “como desenvolver o seu potencial” e “como equilibrar o trabalho com a vida pessoal”. “Em cada país, o currículo é adaptado às inquietações mais frequentes da população”, esclarece Jackie de Botton, prima do fundador, que vive no Rio de Janeiro. Um pequeno aperitivo está também disponível em Portugal. A editora Lua de Papel publicou os primeiros volumes da colecção de desenvolvimento pessoal The School of Life, escrita por professores da escola. Com livros publicados em mais de 30 países, aos 43 anos, Alain de Botton reafirma que escrever continua a ser um desafio. Mas, como faz parte do seu estilo, simplifica: “Há tantas boas ideias que não são conhecidas. Eu apenas tento dar-lhes tempo de antena”.

 

5 minutos com Alain de Botton

Convidado de honra das Conferências Fidelidade Seguros, que decorreram em Lisboa, na Fundação Champalimaud, Alain de Botton falou com a RECICLA.

Para viver bem, não podemos viver sem…

… pensar!

Quais os pilares da nossa felicidade?

Amor e trabalho. Achamos que se trabalharmos arduamente num emprego que gostamos e que se encontrarmos a pessoa certa, seremos felizes. Mas é muito mais difícil do que isso…

Porquê?

Um dos problemas que temos é a ideia de perfeição. Pensamos que podemos ter uma vida perfeita, mas ela tem um lado trágico. Há coisas que não iremos conseguir resolver porque somos demasiado estúpidos, frágeis ou impacientes… Em vez de encararmos isso com raiva, deveríamos aceitar isso com dignidade.

A filosofia ajuda-nos a viver melhor e mais sabiamente?

Sim, no sentido básico, inicial da filosofia, que talvez seja mais próximo da ideia que as pessoas têm da psicoterapia. Aquele que examina o que estamos a fazer e a sentir, que faz com que falemos sobre isso e que tenta encontrar um sentido. A maioria dos nossos problemas vem do facto de não sabermos o que queremos, o que realmente estamos a sentir, de não fazermos uma análise correcta dos nossos problemas e por isso agimos de forma confusa.

O que procura ensinar aos seus filhos?

Que os adultos não têm todas as respostas, que há muitos mistérios na vida e que eles terão a hipótese de resolver alguns. Tento ensinar-lhes a serem ambiciosos, não no sentido de riqueza ou status, mas com o significado de tentarem fazer algo de útil com as suas vidas.

E o que aprendeu com eles sobre a vida?

Que é muito, muito difícil ensinar alguma coisa a uma pessoa. Apercebemo-nos de que existe muito pouco espaço de manobra na personalidade deles – a tua capacidade de mudar alguma coisa é muito pequena. Ensinaram-me também a ter paciência e esperança de que as coisas irão acabar por correr bem.

Prazeres que não custam dinheiro. Quais destacaria?

São prazeres sobretudo de ligação com outras pessoas, de relação. Ser ouvido, perceber os outros, são grandes prazeres. Encontrar outras pessoas de quem possas gostar… Mas é também muito difícil; é muito mais fácil ir às compras.

Tempo é dinheiro ou é uma dádiva?

Os dois. Todos temos que decidir quanto tempo vamos gastar a fazer dinheiro ou a fazer outras coisas e é um equilíbrio muito difícil de atingir. O impulso é de tentar sempre fazer mais dinheiro, mas a certa altura da vida pensas que o tempo é mais importante do que o dinheiro. É preciso estares muito confiante em ti próprio para dizeres que queres ir atrás de mais tempo e não de mais dinheiro.

Viveu durante um mês fechado num aeroporto. Se pudesse escolher um local da natureza para fazer uma experiência idêntica qual seria?

Os limites do Sahara.

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