Logo Sociedade Ponto Verde

EMANUEL SANTOS E A MÚSICA REINVENTADA
Emanuel Santos e a música reinventada
2015-08-20
Emanuel Santos e a música reinventada

Santa Cecília


Emanuel Santos foi à cultura popular norte-americana e trouxe-nos as cigar box guitars, guitarras feitas a partir de caixas de charutos.

 

Em 2009, Emanuel Santos estava a trabalhar com o TUP (Teatro Universitário do Porto) num espetáculo chamado ALAN, que tinha por base a vida e obra de Tom Waits. Durante o processo, encontrou as cigar box guitars e todos acharam que faria sentido incluir um desses instrumentos no espetáculo. “Propus-me construir uma utilizando uma caixa de joias de madeira que tinha. Para mim, ficou um ‘bacalhau’ terrível, mas todos acharam o contrário e mostraram curiosidade sobre aquele estranho objeto sonoro! Isso fez com que continuasse a construir até à data”, recorda o mentor do projeto, que viria a ganhar o nome de Santa Cecília (a santa padroeira dos músicos) e que, olhando para trás, apresenta muitas e, ao mesmo tempo, nenhumas diferenças. “Muitas, pois com a experiência conseguimos corrigir os erros anteriores, melhorar pormenores, desenvolver técnicas e ferramentas. Nenhumas, pois continuo com a mesma vontade de experimentar e construir coisas hoje como da primeira vez!”


Aos poucos, a fama da Santa Cecília, um projeto de criação e construção de instrumentos de cordas, foi-se espalhando, com claro ênfase para cigar box guitars, instrumentos que já pertencem à cultura popular norte-americana e remontam ao tempo da sua Guerra Civil. “A ideia de criar a Santa Cecília surgiu com o propósito de trazer um pouco da tradição destes instrumentos para este lado do Atlântico”, recorda Emanuel, que explica o processo que conduz à construção de uma guitarra: “Escolhida a caixa, é encontrar as madeiras certas, a dimensão e contorno do braço, marcar e aplicar os trastos, cortar, colar, marcar, envernizar, escolher e aplicar as ferragens e eletrónica, colocar cordas e testar, retificar falhas de intonação, voltar a testar, numerar e assinar, voltar a testar, testar, testar, testar… E, entre todas, esta é a melhor e mais importante das fases!” 

 

Curiosamente, não existe um tipo de caixa ideal para se construírem estas guitarras. “Uma das maiores características destes instrumentos é não haver algo ideal!”, solta Emanuel. “Não existe regra para as cigar box guitars… Não existe certo nem errado! E isso é um ‘lugar’ muito bom para trabalhar!” E é sobre novidades relacionadas com este trabalho que terminamos a conversa. “Além das caixas de charuto tornadas instrumento, tenho andado a experimentar construir outras coisas. Penso que ainda este ano outros cordofones irão aparecer com o carimbo Santa Cecília. Uns novos e outros com vida nova!”

 

Juntar o útil ao agradável

O momento em que o projeto permite juntar a música e a sustentabilidade 

 

Durante a entrevista, Emanuel Santos recorda que, na sua génese, as cigar box guitars estavam associadas a classes sociais baixas, que, por não terem como pagar instrumentos, criavam os seus próprios a partir do lixo da burguesia. Cerca de 150 anos depois, estas peças históricas ganham destaque em Portugal a partir de um projeto que permite reutilizar materiais e que apresenta outras preocupações ambientais. Por exemplo, o facto de a secagem ser feita naturalmente permite poupar a energia dispendida por uma estufa artificial. “Especialmente de inverno, pode interferir no tempo de construção, pois é normal que demore um pouco a secar sem um ambiente controlado”, explica o mentor. “Em relação a colas e verniz, tenho usado produtos aquosos, mais fáceis de limpar dos instrumentos de aplicação e muito menos poluentes. Também não utilizo produtos de origem animal, como colas, pele ou osso. Esta vertente sustentável está entranhada na nossa carga genética, temos é que mantê-la viva. Penso que estes objetos cumprem bem essa função e isso também me agrada neles!”

DESCUBRA AINDA